Cartão deixado por minha mãe |
Chega um tempo em que as perdas se somam, fazem-se mais
constantes. Vai-se aquele amigo de mais de 40 anos, e o que falava todo dia ao telefone
com você. Um de mal do coração, outro de
HIV... às vezes vão-se dois na mesma semana. E a gente se sente mais pobre. Às vezes
sente tanto que nem chora. E pensa: ” Ah, como era bom quando eu chorava tanto!
Chorava assistindo novela!” Por que será que se chora menos quando envelhece?
Dizia minha avó: “As lágrimas secam!”
Tem uns que a gente nem perde para a morte. Perde mesmo para
a vida. A vida, com as suas solapadas! Um dia você encontra seu amigo e não
encontra mais o seu abraço. Olha nos seus olhos, e...onde está ele? A vida o
trancafiou em portas de ferro dentro de si mesmo. Pior: jogou fora as chaves.
Ele não está mais ali para o seu afeto, para nenhum afeto talvez. Caiu na tristeza
egóica da velhice, sucumbiu.
Mas não quero ser sombria. Dos amigos que se vão tento
pensar sempre no que deixaram comigo, do que deixaram em mim. Eu os levo dentro
de mim, na caminhada. Não como sua carcereira, mas hospedeira. Conformada e
grata.
Vivia um destes momentos de perdas múltiplas, de lágrimas
secas e de pensamentos gratos , quando recebi por email um poema,
de alguém que nem sei quem é, como se adivinhasse .
RECADO AOS AMIGOS DISTANTES
Meus companheiros amados,
não vos espero nem chamo:
porque vou para outros lados.
Mas é certo que vos amo.
Nem sempre os que estão mais perto
fazem melhor companhia.
Mesmo com sol encoberto,
todos sabem quando é dia.
Pelo vosso campo imenso,
vou cortando meus atalhos.
Por vosso amor é que penso
e me dou tantos trabalhos.
Não condeneis, por enquanto,
minha rebelde maneira.
Para libertar-me tanto,
fico vossa prisioneira.
Por mais que longe pareça,
ides na minha lembrança,
ides na minha cabeça,
valeis a minha Esperança.
Meus companheiros amados,
não vos espero nem chamo:
porque vou para outros lados.
Mas é certo que vos amo.
Nem sempre os que estão mais perto
fazem melhor companhia.
Mesmo com sol encoberto,
todos sabem quando é dia.
Pelo vosso campo imenso,
vou cortando meus atalhos.
Por vosso amor é que penso
e me dou tantos trabalhos.
Não condeneis, por enquanto,
minha rebelde maneira.
Para libertar-me tanto,
fico vossa prisioneira.
Por mais que longe pareça,
ides na minha lembrança,
ides na minha cabeça,
valeis a minha Esperança.
( Cecília Meirelles, “Poemas – 1951)
Há um outro poema que muitas vezes me carrega no colo nessas
horas, do poeta Solda para o poeta Paulo Leminski
POEMA PARA
PAULO LEMINSKI
vai
meu amigo
desta vez
não vou contigo
a morte
é um vício
muito antigo
só que nunca
aconteceu
comigo
pode ir
que eu não ligo
eu fico por aqui
separando
tijolo do trigo
vai
meu amigo
desta vez
não vou contigo
a morte
é um vício
muito antigo
só que nunca
aconteceu
comigo
pode ir
que eu não ligo
eu fico por aqui
separando
tijolo do trigo
(Solda)
Minha mãe,
quando morreu ( sempre acho que em algum área da alma a pessoa sabe que vai
morrer), deixou na mesa de cabeceira um cartão recortado em tesoura de picotar –
ela adorava tesoura de picotar - com frase de Antoine de Saint Exupéry:
“Aqueles que passam por nós, não vão sós,
não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós.”
Tenho acompanhado esse seu momento... que vai chegar pra todos nós. Tenho pensado muito na morte, na minha e na dos que amo. Estou totalmente despreparada. E quando estaremos preparados? Nunca. Antes disso quero curtir os que amo e eu te amo, viu? Saudades de estar próxima de você, pessoa preciosa. Saudades mesmo. Esses encontros rapidos que temos as vezes não resolvem nem 1% da falta que sinto de você. <3. Barbara
ResponderExcluirBeijo, minha querida Bárbara.
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